"Je ne veux rien."


O polonês Krzysztof Kieslowski tem três filmes conhecidos como "A Triologia das Cores", e parece ser consenso que A Fraternidade é Vermelha (1994) é o melhor dos três, sendo, inclusive, aquele que fecha os filmes, que podem/devem ser vistos na ordem das cores da bandeira francesa. São todos filmes interessantíssimos, que discutiam questões pertinentes à União Européia já nos anos 90, e que hoje continuam igualmente pertinentes, talvez até mais... obrigado, crise!

Mas não dá pra sequer comparar com "triologias" mais novinhas, como Crepúsculo, e nem com aquelas que são tão legais, como De Volta Para o Futuro ou mesmo O Senhor dos Anéis, porque os conteúdos não têm absolutamente nada a ver. E, sinceramente, nem vale a pena, mas o ponto é outro. Dá pra conciliar as duas coisas? Quer dizer, dá pra assistir aos filmes do Kieslowski, por exemplo, ou mesmo do Bergman, Fellini, Kubrick, ou sei lá mais qual diretor "cult" e, no dia seguinte, sentar no sofá e ver algo tão ruim e tosco, simplesmente por pura diversão?
 
É forçar a barra, mas, por exemplo, o tosquíssimo Battleship (2012), que supostamente deveria evocar a emoçao de jogar Batalha Naval, mas mais parece Transformers (2007) na água, até visualmente (o que não é nenhuma surpresa, considerando que são os mesmos produtores). É muito, mas muito ruim, de verdade, tanto que não dá pra entender por que diabos Liam Neeson está lá, além de dinheiro. Mas, assim, à sua maneira, consegue entreter por coisa de uns 60 minutos, mesmo porque não tem como assistir a tudo, é preciso pular umas partes, como os diálogos inúteis do filme, ou qualquer outro momento (até mesmo irritante, por sinal) que não seja navios atirando em navios, o que é realmente legal, até porque tudo que se tem no cinema nesse sentido são piratas pulando de um barco pro outro, e canhões disparando bolas de ferro.
 
São dois opostos: um filme BOM, que leva à reflexão, força a massa cinzenta, gera reações mais intensas e não superficiais, e deixa sua marca; do outro lado, um filme feito para DIVERSÃO. E qual o problema em curtir ambos? Talvez seja praticamente ser eclético para filmes, conseguir assisitir a duas coisas tão antagônicas, ainda que exista uma clara preferência por algum "tipo" - caso seja Battleship, é preciso procurar ajuda. Sério.
 
É mais ou menos como ser extremista, deixar de ver um filme de Hollywood porque ele é de Hollywood, sem nem querer saber se é bom ou ruim, e ficar o tempo todo vendo esses filmes-cabeça, muitos dos quais, convenhamos, são como ouvir Pink Floyd ou Radiohead: não dá pra fazer isso toda e qualquer hora. É preciso um certo mood. Ninguém chega em casa, podre de cansado, querendo esvaziar a cabeça, e coloca Persona (1966) só para aliviar. Claro, dá pra ser alguma comédia boa de Jim Abrahams e David Zucker, como o sensacional Apertem os cintos... O piloto sumiu! (1980), mas ainda assim, são filmes feitos essencialmente para divertir, como também bons filmes de ação ou aventura, um suspense e até terror.

Woody Allen, genial, é um dos diretores mais versáteis, nesse sentido. Seu senso de humor é refinadíssimo, e mesmo seus filmes mais românticos, como Meia-Noite em Paris (2011), são ao mesmo tempo leves e mais profundos, com cenas e personagens memoráveis, que se tornam referências.
 
Agora, voltando ao ponto, não tem problema nenhum em querer ver o bom e velho Arnold Schwarzenegger no que ele faz de melhor, e não tem que ser com culpa. Ter tais "pecados", ou mesmo querer sair da rotina "cult" e ver alguma porcaria no cinema, não é problema nenhum, desde que conscientemente. Nem 8, ou nada de cérebro, nem 80, só coisa cabeça, mesmo porque ser tosco de vez em quando também é saudável, mesmo que fique aquela sensação de que duas horas da vida foram desperdiçadas. Meio que tão boa quanto uma bela ressaca.
3 Responses
  1. Primeiro, o que eu mais gosto é "A Igualdade é Branca", é o mais divertido!
    Frase sua "Ninguém chega em casa, podre de cansado, querendo esvaziar a cabeça, e coloca Persona (1966) só para aliviar." FATO!
    A maioria dos filmes Hollywoodianos realmente deixam a desejar, e felizmente temos diretores que as vezes, para nós que damos preferências para filmes mais "cult", como Woody, que conseguem fazer um filme leve.
    E sim, precisamos de leveza na vida - isso sempre me lembra Italo Calvino, sabe de qual livro to falando?
    Eu sempre assisto, normalmente em um domingo de manhã/tarde um filme bem bobo ou um que já conheço na tv, só pra relaxar.


  2. otavio Says:

    Tá, o argumento é até bom, realmente a atitude “8 ou 80”, radical e extremista acaba parecendo no fim pouco inteligente visto que no fim ver filme não passa de um entretenimento cuja finalidade principal é trazer bem estar de alguma forma que não precida necessariamente e na maioria não o é, por meio de despertar reflexões maiores, pelo contrário! Também é válida com certeza a idéia de que precisamos imprimir leveza à vida. Contudo, embora válidos argumento e idéia, continuo sendo “fundamentalista” em matéria de filme, usando pra isso o simples argumento de que há tanta coisa “de qualidade” (mínima!)pra assistir e nosso tempo, no geral e quase sempre, tão curto, que até pra ser “tosco” nesse sentido, temos que ter moderação e estabelecer “limites”, na minha opinião. Claro que também tudo é questão de gosto no fim! Também concordo que Woody Allen casa bem leveza com profundidade, Agora assistir Arnold e porcarias no cinema, bem... prefiro não comentar mais! 


  3. Ana Luísa Says:

    "Meia-noite em Paris" me fez viajar nas compressões de tempo e espaço, mas me apunhalou com a última cena, quase me matando de desgosto. :(